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domingo, 22 de outubro de 2023

Carrão e dai

Imaginem só, cidade cheia de Smarts, Fiats 500, Minis, C3 e outros pequenos carros, moderninhos e cheios de tecnologia. Que beleza!
O moderno hoje significa "reduzir dimensões".
Tal termo foi aplicado para definir a atual tendência de reduzir o tamanho dos motores, a cilindrada, visando a obtenção de menores emissões poluentes e consumo, enquanto se empregam outros meios para alcançar potência e torque semelhantes ou mesmo maiores que os do motor de cilindrada superior. Pode-se falar também em redução de custos, pois menos matéria-prima é necessária para construir um motor menor. Mas não é certo que o pequeno propulsor será mais barato em termos do custo final de produção, pois a conta não considera apenas a quantidade de material usado, e sim  e principalmente o tipo de material (o mais caro alumínio contra o mais barato ferro fundido, por exemplo) e a tecnologia empregada. Um carro bom não precisa ter um motor de cinco cilindros em linha e 2,45 litros, com potência de 160 cv e torque máximo de 21 m.kgf, para ser vigoroso, como pode ser tão ou mais vigoroso usa um motor de 1,4 litro e quatro cilindros com turbocompressor, 152 cv e 21 m.kgf números que explicam melhor a tendência., é a diferença dos modelos.
É fácil perceber que, enquanto a potência decresceu levemente com a mudança, o torque permaneceu igual. E isso preserva as sensações positivas ao acelerador, mesmo usando um motor 1,0 litro menor. Evidentemente, com 1,4 litro para "encher", mesmo com turbo, a tendência é obter um motor de consumo e emissões menores do que aquele com 2,45 litros de capacidade.
Uma jovem senhora e um rapaz se derretem, enaltecendo as características do utilitário esporte (SUV) que definem como "um carrão"...num comercial...e tal filminho me serve para entrar no (polêmico, eu imagino) tema...carrão, 
Como assim.
Carrão pois luxuoso,
Carrão por ser tecnologicamente avançado
Carrão por ser potente
Ser um carrão por razões técnicas, razoáveis, mas não excepcionais. Tem um preço convidativo, mas suponho que, ao defini-lo como "carrão", os citados se referem a um conluio entre tamanho externo e imponência. Sim, a imponência...Estes quesitos estão, aparentemente, ocupando as primeiras linhas das listas de prioridades de muitos consumidores brasilieiros na hora de escolher um automóvel, um exibicionismo inconsequente que se disfarça sob aspectos confessos e inconfessos.
Aos confessos: carro grande "é mais seguro" ou "preciso de carro grande pois levo muita bagagem" ou "é melhor sobrar espaço do que faltar" ou "me sinto mais segura(o) dirigindo em posição elevada" ou (o mais popular, talvez) "com tanto buraco, valeta ou lombada, só sendo quase um jipe para aguentar" e a aos inconfessos: "que bom olhar os outros de cima para baixo, impõe respeito" ou "quero ver alguém me dar uma fechada com esse para-choque nesta altura" ou "se alguém for encostar em mim estacionando vai se ferrar" ou "com todo esse tamanho, vão pensar que custa mais do que o que paguei".
Entendemos, todos, a humana necessidade de sermos invejados. A quem se apressa para dizer "eu não", traduzo em outras palavras, de teor mais suave: Quem não gosta de ser visto com admiração? Pois é. Todos nós, sem exceção. Mas a sociedade, seja pela propaganda, seja por outras particularidades de nosso tempo, incute desejos que não resistem a uma análise lógica dos fatos, a um pensamento mais coerente, coordenado por valores mais essenciais do que pueris, menos imbuídos de sentimentos como vaidade, soberba, futilidade ou leviandade.
Eu andei nas ruas onde vi pessoas de classes consideradas média-alta e alta.. medicos advogados, e o que me me espanta verificar a quantidade de monstrengos 4x4 dirigidos por senhoras, muitos deles até blindados, e na sua totalidade dotados de películas nos vidros que, de tão escuras, fariam o lado escuro da lua parecer claro. Alguns desses veículos, de tão largos, mereceriam multas de estacionamento em fila-dupla mesmo quando corretamente parados junto ao meio-fio. E aí me pergunto: precisa mesmo de tudo isso? Desse tamanhão todo?
os motoristas?
Nesse bizarro cenário..me arrisco mais: será que esses e essas motoristas estão efetivamente habilitados à condução destes paquidermes, onde habilitado não significa "autorizado pela lei" mas sim "capaz de controlá-lo decentemente"? Mesmo quem se julga um tremendo motorista há de concordar: circular com tantos metros quadrados de lata em volta não é tarefa das mais fáceis numa cidade
Nas grandes cidades norte-americanas, onde as ruas são largas e há espaço para dar e vender. Mesmo onde moro, bairro tranquilo e onde não faltam vagas, percebo vizinhos entrando em sinucas de bico tirando e pondo seus utilitários esporte da garagem. Ora, isso é qualidade de vida.

Não vou cair na fácil armadilha que é estender meu discurso contra o automóvel de um modo geral e suas deformadas utilizações, apesar de entender que é realmente estranho verificar que a maioria dos carros circula apenas com seus motoristas a bordo, ou seja, com uma ociosidade de ocupação de 80%, que faria quebrar hotéis ou companhias aéreas.
Mas não tratamos aqui de negócios ou de um mundo ideal, politicamente correto. Tratamos, sim, de uma sociedade gostemos ou não  baseada no transporte individual e que tem uma relação nada racional com seus carros, mas sim plena de emotividade e simbologias.
Carro é status. Carro é poder. Carro é prazer. Mas... menos, gente, bem menos.
O Hummer e seus 2 km/l de gasolina não é correto, mas não precisamos ir tão longe e nem sermos tão exóticos.
Incorreto também é o picape de cabine dupla ou utilitário esporte empurrado por caros e duráveis motores a diesel, sub-utilizados para percorrer sim ou não 1.000 quilômetros ao mês. E cuspindo a fuligem de um combustível que fábricas e governo insistem em manter num padrão de Terceiro Mundo. Esses aspectos a valorização dos utilitários e dos motores a diesel para uso em baixa quilometragem são as trevas de uma sociedade individualista como poucas. E muito ignorante também.
Mesmo nos Estados Unidos, berço das banheiras gastonas e dos utilitários de grande porte, boa parcela da sociedade já não quer saber desses símbolos de uma época que passou, perdulária e ambientalmente agressiva. Quem raciocina, por lá, ou quer um carro pequeno e econômico ou, idealmente  apesar do preço elevado , um híbrido, para mostrar que se preocupa e muito com o futuro do planeta. E não só na teoria. Na Europa os utilitários não chegaram a ter um verdadeiro apogeu, pois em muitos lugares do velho continente é praticamente impossível ter um veículo de grandes dimensões para circular em ruas medievais, projetadas para homens e seus burros puxando pequenas carroças, e não burros dirigindo grandes carroças...
É evidente que picapes, grandes e médios SUVs e os 4x4 de um modo geral têm sua utilidade, seu ambiente ideal de ação, e chegam a ser insubstituíveis para certas tarefas. Mas que não é levar filho na escola nem executivo para lá e para cá na urbe superlotada. Cedo ou tarde, gostaria que a ficha desse povo que mora nas grandes cidades brasileiras caísse e que chegássemos à óbvia conclusão:
de que imponência é algo brega, que ser perdulário é prejudicar o futuro de todos, é crime de lesa-humanidade.
Carros pequenos e moderninhos e cheios de tecnologia. Que beleza! e eu ai com meu fiat 500..ok